No fundo, muita gente gostaria de viver a liberdade de um relacionamento liberal, mas a vergonha, o medo do julgamento e os tabus ainda falam mais alto. O desejo existe, mas está preso sob camadas de hipocrisia social, conservadorismo religioso e estruturas morais herdadas de uma sociedade patriarcal. E, apesar de o tema estar cada vez mais presente nas redes e na mídia, a reação ainda é, quase sempre, a mesma: negação pública, curiosidade privada.
Esse é o pano de fundo do debate que o Casal Pimenta Rio, formado por Fernando Pimenta e Fátima Lopes, levanta há mais de duas décadas. Referências no universo liberal, eles não apenas vivem esse estilo de vida, como também o promovem ativamente por meio de palestras, redes sociais e das maiores festas de swing e eventos liberais do país. Ao falarem abertamente sobre seus 26 anos como casal liberal, enfrentam tanto a admiração quanto o preconceito escancarado.
“É muito comum a gente ser atacado em comentários de matérias ou nas nossas redes sociais. Gente dizendo que vamos para o inferno, que não temos Deus no coração. Sempre tem alguém chamando isso tudo de promiscuidade ou traição. Mas a sociedade é muito hipócrita, né?”, afirma Fernando Pimenta.
Segundo ele, a raiz disso está em como fomos criados: “Com 60 anos, fui educado numa época em que o homem podia tudo e a mulher nada. Me lembro de ouvir meu pai dizer, quando reclamavam que eu dava em cima da filha de alguém: ‘Segurem suas cabras, porque o meu bode está solto’. É uma mentalidade machista, ultrapassada, mas ainda muito presente. A real é que as pessoas não são tão contra quanto fingem ser. O que incomoda é a liberdade que a gente tem de falar sobre isso.”
A fala de Fernando reflete um incômodo estrutural: o desconforto que a liberdade alheia provoca em quem cresceu reprimido. Em feiras e palestras sobre sexualidade e estilo de vida liberal, o casal percebe a ambiguidade escancarada nas reações.
“As pessoas nos abordam como se fôssemos alienígenas. Dizem que têm curiosidade, mas que também têm muito preconceito por causa da criação ou da religião. A mulher, principalmente, foi criada para servir, para ser recatada. E, mesmo assim, muitas vêm às nossas festas nervosas, tremendo, com medo do que vão encontrar, mas estão lá. Estão lá porque querem saber como é, querem sentir”, relata Fátima Lopes.
Para o casal, essa contradição revela um desejo reprimido. Gente que julga publicamente, mas entra em aplicativos liberais com perfis falsos só para espiar. Gente que critica, mas que envia mensagens privadas buscando informações.
“A internet popularizou o tema, e com isso aumentou também o número de perfis fakes nos aplicativos liberais. Pessoas que querem só observar, ter contato com o meio, mas não têm coragem de se assumir. É só curiosidade disfarçada”, conta Fernando.
Esse fenômeno levou os principais apps e redes sociais do meio liberal a adotarem um sistema de convite fechado: só entra quem for indicado por alguém de confiança e, de preferência, conhecido pessoalmente. Caso contrário, o risco de quebra de regras, e da manutenção do respeito mútuo que sustenta esse universo é alto.
Ainda assim, o julgamento persiste. E vem carregado de um discurso religioso e moralista que questiona até o amor que une Fernando e Fátima.
“As pessoas dizem: ‘vocês não se amam’, ‘um casal que se ama não transa com outras pessoas’. Mas não conseguem entender que existe o sexo com amor e o sexo pelo tesão. O amor é o que temos entre nós — 26 anos juntos, sendo 25 como casal liberal, e o sexo com outros é desejo, não ameaça”, explica Fátima.
Para eles, o preconceito se baseia numa ideia limitada do que é amar e do que é fidelidade. Há, segundo o casal, uma dificuldade geral em compreender que relações não convencionais também podem ser saudáveis, amorosas e duradouras, mesmo quando envolvem outras pessoas.
“Muita gente fala: ‘esse casamento tá por um fio’. Mas a verdade é que a gente tem um laço que muito casal tradicional não tem. A gente conversa, a gente se escuta, a gente se deseja, e escolhe viver isso tudo com verdade. O resto é ruído”, conclui Fernando.
Apesar dos ataques e julgamentos, o Casal Pimenta Rio segue promovendo liberdade, prazer e autenticidade, para quem tem coragem de encarar seus próprios desejos de frente. “Porque viver um relacionamento liberal é, antes de tudo, sobre liberdade de escolha. E isso, para muitos, ainda é mais assustador do que o próprio desejo”, afirmam.
Fernando e Fátima, conhecidos como Casal Pimenta, estão juntos há 26 anos e são referências no meio liberal no Rio de Janeiro. Fátima teve uma formação católica, chegando a dar aulas de catequese, mas ao longo do tempo, ambos decidiram explorar novas dimensões de sua sexualidade. Há mais de duas décadas, ingressaram no universo do swing e, desde então, promovem algumas das festas mais renomadas da cena carioca, que atrai um público diversificado e animado desde 2010.
Além de organizarem eventos, são palestrantes e escritores sobre o tema, ajudando casais a compreenderem melhor o meio liberal e a utilizarem o swing como uma ferramenta para apimentar a relação. Compartilham suas experiências e conhecimentos em plataformas digitais, como seu canal no YouTube e perfil no Instagram, contribuindo para a desmistificação e disseminação de informações sobre o estilo de vida liberal.